O que é e qual a importância da alfabetização de futuros?
Assim como na criatividade o contexto específico da alfabetização de futuros é a imaginação humana, visto que o futuro só pode ser imaginado. Essa alfabetização nos torna cientes das nossas fontes de esperanças e medos, nos fazendo refletir sobre o que nos é desejável ou não. Essa atitude melhora nossa capacidade de criar imagens do futuro e nos faz apreciar de uma forma melhor o espectro de possibilidades do mundo e a tomar decisões.
Desde os tempos antigos busca-se entender ou prever o futuro, normalmente ligado a campos como adivinhação, profecia e etc. Recentemente estudar o futuro tornou-se um campo estratégico, fazendo parte do planejamento das grandes empresas, devido ao grande desejo de se controlar o amanhã.
O grande erro é que a maior parte dos esforços para pensar sobre o futuro é realizado para colonizar o amanhã com as ideias de hoje. A cultura atual, as normas, regras, leis, costumes e discursos limitam as nossas visões de futuro. Ao tentarmos imaginar o futuro com os paradigmas pré definidos do presente estamos muito próximos do erro, pois a evolução é exponencial. Possivelmente, no ano 2000, a maioria das pessoas não imaginariam que o smartphone seria um produto fundamental na vida humana, que a internet estivesse democratizada a boa parte da população ou que a China seria essa potência mundial que conhecemos hoje.
O pensamento dominante utiliza futuros baseados totalmente no hoje, baseados em modelos pré-existentes, tão baseado no hoje que já é praticamente realidade, irá se concretizar em curto prazo. Mas não é nas tendências de um futuro emergente que devemos basear nosso planejamento de longo prazo.
Nós devemos buscar mais clareza e menos certezas. Por isso é importante explorar visões de futuro, as diversas possibilidades. Do contrário, se confiarmos cegamente numa previsão a maioria dos fenômenos novos nos permanecerá invisíveis, porque são excluídos das nossas imagens de futuro, nos pegando de surpresa.
Assim que esse exercício de imaginar futuros assumiu um perfil mais elevado do que mera especulação cotidiana e passou-se a formar-se as Future Studies, nós pudemos observar a aplicação de novas ferramentas e o surgimento de novos profissionais, tais como Coolhunter, trendforecaster, futuristas, entre outros. Cada um desses profissionais têm hoje seu próprio campo de estudo e metodologia. Mas no geral seus papéis são o de investigar, explorar, traduzir e acelerar as possibilidades de futuro, construindo visões de futuro baseadas em imagens do passado e do presente.
A alfabetização sobre o futuro depende da capacidade humana de imaginação. Essa habilidade amplia o campo de estudos futuros para incluir melhor planejamento e improvisação.
É preciso entender que não há apenas um futuro, segundo James Dator: “O futurismo não é premonitório. Não há nenhum futuro para ser previsto, o que existem são vários futuros alternativos para serem antecipados de modo a gerar impacto positivo e minimizar problemas futuros”.
Dessa forma, podemos entender que o que existe são possibilidades de futuro, um enorme espectro de futuros alternativos. Ao imaginar e abrir essas possibilidades nós encontraremos perspectivas de futuro que podem ser desejáveis ou catastróficas. Ao encontramos perspectivas desejáveis poderemos traduzir seus sinais e acelerar a transformação fazendo com que saia de uma tendência e torne-se realidade. Entretanto ao encontramos possibilidades de futuros catastróficos poderemos traduzir seus sinais e construir estratégias para evitá-los ou minimizar suas consequências negativas.
O objetivo de amplificar o alcance da alfabetização de futuro é permitir que as pessoas percebam através da própria imaginação os seus sonhos e pesadelos, busquem suposições antecipatórias para descrever o futuro, que entendam a riqueza de possibilidades e possam se planejar pra isso. E, claro, o mais importante, fazer com que essas pessoas construam o próprio futuro de acordo com aquilo que desejam.
Quando a gente não pensa sobre o futuro, permitimos que outras pessoas pensem por nós.
Essa frase de Tiago Mattos corrobora perfeitamente com o que foi dito por Pupul Bishit que enfatiza que não vão acontecer futuros melhores e mais inclusivos até que reconheçamos que o futuro para todos não pode ser imaginado por poucos. Seguindo seu raciocínio ela prossegue dizendo:
“Tenho viajado como uma contadora de histórias nômade e futurista por pessoas e lugares, mas em todos os lugares que eu fui, perguntei às comunidades: ‘qual é o futuro que vocês querem?’, e eles disseram que nunca haviam feito essa pergunta antes. É por isso que promover a alfabetização do futuro é tão importante”.
Outro ponto fundamental em ampliar o conhecimento das pessoas com a alfabetização de cultura é evitar a colonização do pensamento. Em diversas áreas, inclusive no futurismo, as vozes predominantes são de homens, brancos, héteros que vivem em algum país desenvolvido. É interessante refletir que as pessoas costumam enxergar bem apenas a sua própria realidade, e por isso suas visões de futuro se baseiam na sua vivência, vieses, experiências e visão de mundo. As tendências vividas no centro do Vale do Silício são bem diferentes da vivida numa metrópole brasileira como Belém do Pará. Ao convidar mais pessoas a imaginar o futuro, estamos convidando também mais pessoas a criar o futuro que sonham. Dessa forma estaremos evitando a colonização dos pensamentos. Segundo Bayo Akomolafe:
“A colonização é realmente sobre homogeneização e produção em massa. Trata-se da esterilização da esperança, do fracasso da imaginação e da condensação do múltiplo em uma única história”.
Imaginar o futuro é um espaço de oportunidade para o ser humano compreender a formulação de desejos em relação à vida pessoal e profissional. Quanto melhores os seres humanos puderem se tornar na compreensão das diferentes explicações e métodos para imaginar o futuro, menos razão haverá para temer o futuro e melhor seremos capazes de aproveitar as oportunidades futuras e dar sentido às mudanças e novidades.
Imaginar o futuro é um ato de resistência, é um ato político. Imaginar o futuro é o primeiro passo para começar a criá-lo.
Texto baseado e adaptado na obra escrita por: Nicklas Larsen, Jeanette Kæseler Mortensen & Riel Miller, do Copenhagen Institute for Futures Studies and UNESCO.
E também um agradecimento especial à Yasmin Seadi, sem a curadoria dela na Carta da Sereya eu dificilmente teria encontrado o texto base pra esse texto que escrevi. Muito obrigado. Vale muito à pena assinar gratuitamente a Carta da Sereya.
Texto por: Victor Maués Rodrigues.